Fidel: “Snowden prestou um serviço ao mundo ao revelar a política repugnantemente desonesta do império poderoso, que está mentindo e enganando o mundo.”
Via Correio do Brasil
Ex-presidente e líder da Revolução Cubana, Fidel Castro criticou na quarta-feira, dia 28/8, um jornal russo que noticiou que Cuba teria cedido a pressões dos EUA e se recusado a receber o norte-americano Edward Snowden. A declaração do líder cubano ocorre 72 horas após o Correio do Brasil publicar matéria exclusiva, em linha com o desmentido. Fidel, em 2006, deixou o poder para um tratamento de saúde, mas se mantém ativo na vida política de seu país. Em um dos frequentes textos publicados na imprensa cubana, Fidel disse que a reportagem publicada na segunda-feira, dia 26/8, pelo jornal Kommersant constitui uma “mentira” e “calúnia”.
Snowden, ex-técnico de inteligência dos EUA, recebeu asilo na Rússia depois de revelar programas secretos de monitoramento de comunicações telefônicas e digitais. Os EUA gostariam que ele fosse devolvido ao país para ser julgado por traição. Antes de receber asilo temporário, Snowden passou várias semanas num limbo jurídico no aeroporto internacional de Moscou, à espera de tentar embarcar para algum país latino-americano que o recebesse. Nesse período, chegou a ser dado como certo que ele viajaria de Moscou para Havana, o que não ocorreu. O Kommersant disse que o embarque foi abortado porque Havana teria cedido à pressão de Washington.
Em seu artigo, o veterano dirigente comunista aplaude Snowden e critica a espionagem norte-americana. “É óbvio que os Estados Unidos sempre vão tentar pressionar Cuba, mas não é à toa que [Cuba] resiste e se defende sem trégua há 54 anos, e irá continuar a fazê-lo enquanto for necessário”, escreveu Fidel, de 83 anos, que comandou a Revolução de 1959, que implantou o comunismo em Cuba. Segundo Fidel, o Kommersant é conhecido por ser um jornal “contrarrevolucionário” e “mercenário”.
“Admiro as declarações justas e corajosas de Snowden”, escreveu Fidel. “Em minha opinião, ele prestou um serviço ao mundo ao revelar a política repugnantemente desonesta do império poderoso, que está mentindo e enganando o mundo.”
O ex-espião da Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês) e prestador de serviço para a Agência Central de Inteligência (CIA, também na sigla em inglês) Edward Snowden optou por não seguir viagem, a partir de Moscou, por “uma questão estratégica”, afirmou ao Correio do Brasil, na segunda-feira, dia 26/8, fonte do serviço diplomático cubano na América Latina. Com este desmentido, Cuba descarta a informação de ter cedido às pressões dos Estados Unidos para que não aceitasse a presença do refugiado político em seu território. Snowden, atualmente, reside em Moscou. Um jornal russo, ligado à ultradireita, divulgou que Snowden teria ficado preso na zona de trânsito de um aeroporto de Moscou porque o governo cubano recusou-se a deixá-lo voar da Rússia para Havana, após ameaças dos norte-americanos.
Segundo o diário conservador russo Kommersant, Snowden, procurado pelos EUA por vazar detalhes de programas de vigilância do governo norte-americano, planejara voar para Havana a partir de Moscou um dia depois de chegar de Hong Kong, em 23 de junho. Mas o norte-americano, que acabou recebendo asilo de um ano na Rússia após passar quase seis semanas na área de trânsito do aeroporto de Sheremetyevo, não embarcou, embora tivesse um assento em seu nome no avião. Citando fontes, incluindo uma ligada ao Departamento de Estado dos EUA, o jornal disse que a razão foi que Cuba avisou no último minuto às autoridades russas para não deixarem Snowden embarcar no voo da Aeroflot.
O jornal disse, ainda, que Cuba mudara de ideia por pressão dos EUA, que desejam julgar Snowden sob a acusação de espionagem. O Kommersant disse ainda que Snowden passou alguns dias no consulado russo em Hong Kong para declarar sua intenção de voar para a América Latina através de Moscou.
“Sua rota e seu apelo por ajuda foram uma surpresa completa para nós. Nós não o convidamos”, disse ao Kommersant uma fonte estatal russa.
A agência inglesa de notícias Reuters, a exemplo das demais agências internacionais, não pôde confirmar de imediato a reportagem, seja no governo de Havana, seja com o próprio Snowden, que permanece retirado, em um ponto desconhecido do público, em território russo. A fonte ligada ao serviço diplomático cubano a que o CdB teve acesso, no entanto, lembra que o presidente de Cuba, Raul Castro, foi o primeiro a defender, ainda no início de julho deste ano, logo após a decisão de Snowden de permanecer em solo russo, o direito dos países latino-americanos de conceder asilo ao ex-técnico da CIA, Edward Snowden. Raul Castro criticou, ainda, que a atenção sobre este caso se centre na “perseguição” do jovem e não nos sistemas de “espionagem global” dos Estados Unidos.
Castro fez a declaração publicamente, no discurso com que encerrou o primeiro plenário realizado pela Assembleia Nacional de Cuba na atual legislatura. Em sua primeira declaração sobre o caso do ex-técnico que vazou planos de espionagem em massa por parte dos EUA, Castro, porém, não revelou se Cuba havia recebido o pedido de asilo por parte de Snowden nem se permitiria seu trânsito pela ilha rumo a outro país. Ele insistiu em ressaltar que as revelações de Snowden “permitiram confirmar a existência de sistemas de espionagem global dos Estados Unidos, que violam a soberania das nações, inclusive de seus aliados, e dos direitos humanos”.
“Cuba, que foi historicamente um dos países mais agredidos e também mais espionados do planeta, já conhecia a existência destes sistemas de espionagem”, disse o presidente cubano, em seu discurso.
Pesadelo
Advogado de Snowden, Anatoli Koutcherena contou a jornalistas, na véspera, que seu cliente viveu um verdadeiro pesadelo no aeroporto de Moscou, até obter um visto temporário, no dia 1º de agosto.
“Foi um período difícil. Agora ele precisa cuidar de sua saúde e se recuperar psicologicamente. Ele precisa de uma adaptação”, declarou o advogado à rádio pública Golos Rossi (A Voz da Rússia).
De acordo com ele, o ex-consultor da CIA aguarda a chegada do pai e de amigos para tomar algumas decisões importantes. Entre elas, a escolha do local onde pretende morar no país. O advogado também disse que Snowden se sente “mais ou menos bem”, está aprendendo a falar russo e se interessa pela história do país.
No período em que ficou na zona de trânsito do aeroporto russo, Snowden, segundo o advogado, leu “Crime e Castigo” de Dostoïeviski e pediu a obra completa de 18 volumes do historiador russo do século 19 Nikolaï Karamzine. Com o visto temporário, o ex-consultor da CIA pode viajar pela Rússia e trabalhar, exceto no serviço público, segundo o chefe do serviço de Imigração da região de Moscou.
“Ele ainda corre riscos, não pode passear na praça Vermelha ou ir pescar. Ele aguarda com impaciência a chegada do pai”, disse o advogado.
Por enquanto, Snowden também não pode falar em público. Mas mesmo “invisível”, ele já tem diversas propostas de emprego, entre elas, uma vaga no Facebook russo, a rede social Vkontakte. Senadores russos também propuseram ao técnico uma cooperação para detectar falhas na proteção de informações privadas.
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