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Dez informações sobre a saúde e a medicina em Cuba

26 de agosto de 2013

OMS01AMarco Weissheimer, via Sul21

Um dos principais argumentos da reação irada de entidades médicas brasileiras contra a vinda de médicos cubanos para o País consiste em questionar a qualidade e a competência dos profissionais cubanos. O presidente do Conselho Federal de Medicina, Roberto D’Ávila, chegou a dizer que “os cubanos poderão causar um genocídio” no Brasil. Os primeiros 400 médicos cubanos chegaram ao Brasil no fim de semana, em um convênio com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Uma das maneiras de aferir essa qualidade é levar em conta a realidade da saúde e da medicina em Cuba. Eis aqui dez indicadores e informações sobre a saúde cubana para a população brasileira avaliar (os dados são do governo cubano e da Organização Mundial da Saúde):

(1) Em Cuba, há 25 faculdades de medicina (todas públicas) e uma Escola Latino-Americana de Medicina, na qual estudam estrangeiros de 113 países, inclusive do Brasil. Estudaram em Cuba e lá se formaram, entre outros, dois filhos de Paulo de Argollo Mendes, presidente há 15 anos do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul e crítico ferrenho do Programa Mais Médicos).

(2) Em 2012, Cuba formou 11 mil novos médicos. Deste total, 5.315 são cubanos e 5.694 vêm de 59 países principalmente da América Latina, África e Ásia. Desde a Revolução Cubana em 1959, foram formados cerca de 109 mil médicos no país. A Ilha tem 161 hospitais e 452 clínicas para pouco mais de 11,2 milhões de habitantes.

(3) A duração do curso de medicina em Cuba, como no Brasil, é seis anos em período integral. Depois, há um período de especialização que varia entre três e quatro anos. Pelas regras do sistema educacional cubano, só entram no curso de medicina os alunos que obtêm as notas mais altas ao longo do ensino secundário e em um concurso seletivo especial.

(4) Estudantes de medicina cubanos passam o 6º ano do curso em um período de internato, conhecendo as principais áreas de um hospital geral. Sua formação geral é voltada para a área da saúde da família, com conhecimento em pediatria, pequenas cirurgias, ginecologia e obstetrícia.

(5) Em Cuba há hoje 6,4 médicos para mil habitantes. No Brasil, esse índice é de 1,8 médico para mil habitantes. Na Argentina, a proporção é 3,2 médicos para mil habitantes. Em países como Espanha e Portugal, essa relação é de 4 médicos para cada mil habitantes.

(6) A taxa de mortalidade em Cuba é de 4,6 para mil crianças nascidas, e a expectativa de vida é de 77,9 anos (dados de janeiro de 2013). No Brasil, a taxa de mortalidade é de 15,6 para mil bebês nascidos (IBGE/2010).

(7) Em 1998, depois que o furacão Mitch atingiu a América Central e o Caribe, Fidel Castro decidiu criar a Escola Latino-Americana de Medicina de Havana (Elam) com o objetivo de formar em Cuba médicos para trabalhar em países chamados subdesenvolvidos. A Organização Mundial da Saúde definiu assim o trabalho da Elam: “A Escola Latino-Americana de Medicina acolhe jovens entusiasmados dos países em desenvolvimento, que retornam para casa como médicos formados. É uma questão de promover a equidade sanitária. A Elam assumiu a premissa da ‘responsabilidade social’.”

(8) Em 20 anos, médicos cubanos atenderam a mais de 25 mil afetados pela explosão em Chernobyl, incluindo muitas crianças órfãs. Desde o início do programa, em 1990, foram atendidos mais de 25.400 pacientes, a maioria deles crianças. 70% dos menores que receberam tratamento na localidade cubana de Tarará perderam seus pais e chegaram a Cuba com enfermidades oncológicas e hematológicas provocadas pela exposição à radiação (ver vídeo abaixo).

(9) Segundo a New England Journal of Medicine, uma das importantes revistas médicas do mundo, o sistema de saúde cubano parece irreal. Todo mundo tem um médico de família. Tudo é gratuito. Apesar de dispor de recursos limitados, seu sistema de saúde resolveu problemas que o dos EUA não conseguiu resolver ainda.

(10) Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Cuba é o único país da América Latina que se encontra entre as dez primeiras nações do mundo com o melhor Índice de Desenvolvimento Humano em expectativa de vida e educação durante a última década.

Certamente o sistema de saúde cubano não é o paraíso na Terra e seus profissionais não são os melhores do mundo. No entanto, os indicadores e informações acima citados parecem credenciá-los para desenvolver um importante trabalho de medicina comunitária e medicina da família em comunidades pobres brasileiras que têm grande dificuldade de acesso a serviços de saúde. Os profissionais cubanos têm especialização e tradição de trabalhar justamente nesta área. E não representam nenhuma concorrência para profissionais brasileiros nesta área. Virá daí um genocídio?

O espírito da medicina cubana

13 de maio de 2013
Cuba_Elam03_Estudantes_EUA

Estudantes norte-americanos formados pela aclamada Escola de
Medicina América Latina.

Num momento em que se debate tanto se vale a pena ou não importar médicos de Cuba, o Diário faz um mergulho no tema.

Via Diário do Centro do Mundo

O que a Grã-Bretanha pode aprender com o sistema médico de Cuba? Assim começou uma reportagem de um dos mais prestigiosos programas jornalísticos britânicos, o Newsnight, da BBC.

Uma equipe do programa foi enviada a Cuba para entender por que é tão comum o “olhar de admiração” sobre a medicina cubana. O Diário selecionou trechos que jogam luzes sobre um tema que vem despertando discussões apaixonadas no site e fora dele: a questão da importação de 6 mil médicos cubanos para trabalhar em áreas remotas no Brasil.

O relato abaixo foi acrescido de trechos do relatório de uma visita de integrantes do Comitê de Saúde do Parlamento britânico. Da mistura surgiu um retrato da saúde de Cuba.

Bom proveito.

“A lógica subjacente do sistema cubano é incrivelmente simples. Em razão principalmente do bloqueio econômico norte-americano, a economia cubana continuamente sofre.

Saúde, no entanto, é uma prioridade nacional, por motivos, em parte, românticos: Che Guevara, ícone do Partido Comunista, era médico. Mas muito mais por pragmatismo: a saúde admirável da população é certamente uma dos principais motivos pelos quais a família Castro ainda está no poder.

A prioridade em Cuba é impedir que as pessoas fiquem doentes, em primeiro lugar.

Em Cuba você recebe anualmente a visita de um médico. A ideia não é apenas verificar sua saúde, mas ter um olhar mais amplo sobre seu estilo de vida e o ambiente familiar. Essa visita é feita de surpresa, para ser mais eficiente.

Os médicos estão espalhados por toda a população e o governo lhes fornece habitação, bem como às enfermeiras.

A expectativa de vida em Cuba é maior do que a dos Estados Unidos. A relação médico-paciente pode ser comparada a qualquer país da Europa Ocidental.

Há em Cuba um médico por cada 175 pessoas. No Reino Unido, é 1 por 600 pessoas.

Cuba dá ênfase à formação generalista. O currículo foi alterado na década de 1980 para garantir que mais de 90% de todos os graduados completem três anos em clínica geral.

Há um compromisso com o diagnóstico triplo (físico/psicológico/social). Os médicos são reavaliados frequentemente.

Também chama a atenção a Policlínica – uma engenhosa invenção que visa proporcionar serviços como odontologia, pequenas cirurgias, vasectomias e raios X sem a necessidade de uma visita a um hospital. Cada Policlínica tem uma série de especialistas (pediatria, ginecologia, dermatologia, psiquiatria etc.) que resolvem boa parte dos problemas de saúde das comunidades e assim reduzem a necessidade de busca de hospital. Com isso, a lista de espera nos hospitais é quase inexistente.

Todos os lugares que visitamos eram geridos por profissionais da saúde (médicos e enfermeiros).

Fizemos uma visita à Escola de Medicina América Latina, onde médicos estagiários de todo o mundo – muitos deles, para nossa surpresa, norte-americanos – recebem treinamento à moda cubana.

E nos deparamos em nossa visita com pequenos detalhes que podem fazer uma grande diferença: pelotões de aposentados se exercitando todas as manhãs nos parques de Havana.

Apesar de os hospitais não serem equipados com o nível de TI encontrado no Reino Unido, por causa do bloqueio norte-americano, os profissionais de saúde têm uma paixão por dados e estatísticas que eles usam com frequência para fins de governança na saúde.

O contexto da Revolução Cubana e as estruturas sociais desenvolvidos localmente levaram ao envolvimento contínuo do Estado no sistema de saúde. Isto é visto não como a cereja no topo do bolo, mas como uma parte muito importante do próprio bolo.